O Desconto que Faz Você Gastar Mais

Se você ganha um crédito para a próxima compra, se sente mais livre para fazer um gasto desnecessário e vai sentir muito mais no bolso, demonstra estudo recente


Você decide que é hora de trocar o notebook. Entra em um site, escolhe um modelo, de R$ 1.500, que cabe no orçamento, faz a compra e, como brinde, ganha um cupom de desconto de R$ 200 para a próxima compra. Você não precisa comprar mais nada, mas é bem provável que esse desconto vire um tablet ou um celular. É o que demonstra um estudo recente, publicado no Journal of Marketing Research.

Essa promoção de crédito na segunda unidade é popular hoje em dia, principalmente na internet. Por exemplo: alguns sites, depois da compra, oferecem desconto em certos produtos ou um valor na próxima visita. Também existem os serviços de cashback, que devolvem parte do dinheiro gasto como um bônus para a compra seguinte. Hoje o comércio movimenta US$ 14,5 bilhões em créditos por ano nos Estados Unidos.

Mas essas promoções também nos convencem a fazer gastos desnecessários, explicam Andong Cheng (Universidade de Delaware) e Cynthia Crider (Universidade de Washington, Saint Louis), autoras do estudo. Se você paga R$ 1.500 por um computador, mas obtém R$ 200 de desconto para uma segunda compra, pode sentir que o custo cai para R$ 1.300 se comprar o tablet, que custa R$ 900, ou ainda que o tablet, com o crédito, vai sair por R$ 700. Mas é pouco provável pensar que, no fim, vai gastar R$ 700 a mais do que pretendia.

Para demonstrar, elas usaram uma sorveteria frequentada por estudantes. Ao entrar, 172 deles foram abordados pelas pesquisadoras: metade recebeu um desconto de US$ 3 para gastar na hora, e a outra metade, um crédito de US$ 3 para a próxima ida à sorveteria. No primeiro dia, o desconto convenceu mais clientes: 95% deles compraram sorvete, contra 87% dos que receberam o desconto para a próxima compra.


Nos dias seguintes, porém, praticamente um em quatro estudantes (24%) que ganharam o crédito voltou para mais um sorvete. Entre quem ganhou o desconto, o retorno à sorveteria ficou em 5%, ou um em cada 20. Além disso, em média, o grupo que recebeu um desconto na hora gastou US$ 8,43 em todo o experimento. No grupo que recebeu o crédito, o gasto médio foi de US$ 13,24.

O desconto na próxima compra, explicam as pesquisadoras, altera a nossa contabilidade mental, o processo psicológico pelo qual organizamos mentalmente nossas finanças. Isso nos leva a atribuir valores diferentes a um mesmo produto, como considerar que economizamos quando, na verdade, estamos gastando.

Em outro experimento, 460 pessoas formaram três grupos para imaginar a ida a uma loja de roupas. Um grupo compraria sem qualquer desconto, outro teria US$ 20 de desconto se gastasse US$ 50, e o terceiro ganharia um vale-presente de US$ 20 ao gastar US$ 50.



A oferta de um abatimento na próxima compra foi, desta vez, um estímulo maior até do que oferecer um desconto na hora: 89% contra 81%. Sem qualquer vantagem, apenas 63% optaram por comprar. E, com um desconto, os gastos foram muito maiores na primeira compra. Mesmo com os US$ 20 de desconto na segunda vez, quem usou o crédito, no fim das contas, teve o maior gasto.

As pessoas têm a tendência de tratar um vale-presente e outros créditos promocionais como dinheiro, explicam as pesquisadoras. Com isso, criam mentalmente um ganho duplo com o desconto, que podem aplicar tanto à primeira como à segunda compra. O gasto parece mais vantajoso, facilitando um novo.

Você pode evitar essa armadilha em sua próxima compra pensando mais em quanto vai gastar do que na economia oferecida. Afinal, gastar menos também é gastar.


por Samy Dana
Professor da Escola de Administração de Empresas da FGV

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